14 de set. de 2011

Porque sou contra editais de financiamento para HQs


Há alguns anos a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo criou o PROAC, este projeto se destina a apoiar a produção artística com recursos do estado. Veja:

A Lei nº 12.268 de 20/02/06 instituiu o Programa de Ação Cultural e providências correlatas.

São objetivos do Programa de Ação Cultural:
• Apoiar e patrocinar a renovação, o intercâmbio, a divulgação e a produção artística e cultural no Estado;
• Preservar e difundir o patrimônio cultural material e imaterial do Estado;
• Apoiar pesquisas e projetos de formação cultural, bem como a diversidade cultural;
• Apoiar e patrocinar a preservação e a expansão dos espaços de circulação da produção cultural.

O Programa de Ação Cultural é dividido em duas formas de apoio:
1. Editais/Concursos: apoio por meio da seleção pública de projetos cuja premiação é proveniente de recursos orçamentários da Secretaria de Estado da Cultura;
2. Incentivo Fiscal (ICMS): apoio por meio de patrocí­nio(s) de contribuintes habilitados do ICMS a projetos previamente aprovados pela Secretaria de Estado da Cultura.

Entre diversas categorias artísticas foram incluidas as histórias em quadrinhos. Todos os anos este edital seleciona dez projetos de criação de HQs aos quais são concedidos 25 mil reais para a sua produção, divulgação e distribuição.

Este projeto não é inovador, pelo menos desde 2003 conheço iniciativas semelhantes de editais de cultura que fornecem recursos para a publicação de HQs em outros estados, seja através de patrocínio direto ou através do modelo de captação de recursos, onde os artistas recebem uma espécie de autorização do governo para captar os valores junto a empresas privadas, que depois descontam os mesmos valores em impostos devidos ao governo.


O PROAC em São Paulo é um sucesso, este ano foram 137 inscrições. Eu fiquei realmente surpreso quando percebi a enorme quantidade de quadrinistas que se interessam em publicar com recursos do governo.

E também fiquei decepcionado, sabe por quê? Porque sou contra editais de financiamento.

Observando a lista de trabalhos contemplados com o PROAC desde 2008, percebi uma tendência a produção de gibis focados em temas históricos como a Segunda Guerra Mundial, os cangaceiros, aspectos históricos da cidade de São Paulo e na cultura regional.

Parece que existe, não sei se da parte dos próprios artistas ou da equipe de seleção destes projetos um certo direcionamento da temática abordada. É uma coisa tipo: "vamos fazer um projeto sobre isso aqui e o governo aprova, depois compra tudo pra usar como livro didático nas escolas públicas." Daí em vez de o cara produzir algo que tenha relevância comercial e artística, ele faz uma cartilha escolar disfarçada de gibi.

Outra coisa que me decepciona nesse PROAC é um certo desejo de artistas de que o governo assuma a publicação de quadrinhos no Brasil como uma política pública. Quer dizer, em vez do cara ser um empreendedor, ele espera que o Estado seja sua mamãe e financie seus gibis. Em vez dos artistas juntarem forças para montar uma editora, publicar com recursos próprios ou criarem projetos que sejam comercialmente viáveis e possam interessar as editoras e ao público, eles preferem se submeter a burocracia dos "editais".

Ao que parece, alguns projetos interessam editoras como a Devir e Zarabatana, que "investem" na forma de renúncia fiscal de ICMS. Ou seja, basicamente é o governo que paga de forma indireta. O estado é mamãe e todo mundo quer mamar nas tetas dessa vaca velha. O PROAC é o bolsa-quadrinhos. A única coisa que os quadrinistas fazem é uma contrapartida na forma de oficinas de arte e palestras para crianças pobres. Quanta demagogia!

Há autores como Danylo Beyruth que buscam estes editais apenas como um auxílio, mas já desenvolvem seu trabalho de forma independente ou junto as editoras, com PROAC ou sem. Este tipo de ação eu apoio. Mas sinceramente, acredito que não deveriam existir editais de financiamento, não é disso que precisamos para impusionar a produção e publicação de HQs no Brasil.

Precisamos sim de empreendedorismo e de qualidade nos trabalhos. Muitas das obras produzidas através do PROAC são claramente ruins, sem nenhum apelo comercial. Quando estes artistas conseguiriam vender seu trabalho, caminhar sem a muleta do estado? NUNCA! Coisa ruim não vende.

Há exemplos interessantes de artistas que conseguiram se destacar com seu trabalho sem ajuda estatal, temos Fábio Moon e Gabriel Bá. Eles publicaram de forma independente o fanzine Dez Pãezinhos, até conseguir lançá-lo por uma editora. Paralelamente eles divulgaram seu trabalho nos EUA, onde conseguiram se firmar no mercado, com um trabalho autoral. O mesmo foi feito por Rafael Grampá, que publicou o gibi Mesmo Delivery nos EUA com recursos próprios, até chamar a atenção das editoras. Nem preciso citar a história de Maurício de Souza, cujo empreendedorismo é admirável. Turma da Mônica é hoje um dos gibis mais vendidos do mundo. Eu não gosto do trabalho de nenhum deles, mas reconheço o valor do empreendedorismo.

Você também pode não gostar do trabalho desses artistas, que é comercial demais para alguns, mas o caminho seguido por eles é a solução. Duvido que se eles ficassem pelos cantos chorando o paitrocínio do estado e pedindo esmola em editais teriam chegado em algum lugar. Duvido que qualquer artista independente no mundo chegue em algum lugar sendo financiado pelo estado. Imagine Robert Crumb esmolando para publicar a Zap Comix. Imagine Moebius escrevendo a Metal Hurlant em um edital? Imaginou? Não, é inimaginável! Talvez só em países comunistas, onde o estado controla todas as instâncias da vida do cidadão, isto seja uma prática comum.

Outra aberração de determinado grupo de quadrinistas brasileiros é o apoio ao ex-deputado Simplício Mario, do PT do Piauí. Em 2006 ele elaborou o Projeto de Lei 6581/06, que ele imagina ser um incentivo para a produção, publicação e distribuição de revistas em quadrinhos nacionais. Em seu artigo 2o, ele prevê que “as editoras deverão publicar um percentual mínimo de 20% de HQs de origem nacional”. Os lançamentos seriam graduais – apenas 5% no primeiro ano de vigência da lei, 10% no segundo e assim sucessivamente – levando quatro anos para atingir a cota de 20%.

E o cara acha que com isso vai ajudar os artistas dos quadrinhos no Brasil, OBRIGANDO as editoras a publicá-los. Esta fantasia demagógica e stalinista estaria baseada nas leis de proteção ao mercado que existem com relação a diversos produtos para salvaguardá-los da competição estrangeira.

Não seria mais interessante que os artistas produzissem algo que despertasse o interesse das editoras? Não seria mais interessante fazer como Mauricio de Souza, que utilizou o merchandising para transformar seus personagens em ícones do imaginário popular. Não seria mais interessante abrir linhas de crédito para empreendedores que desejassem investir em quadrinhos, diminuir os impostos para baixar o preço das revistas e torná-las mais acessíveis que os produtos estrangeiros? Eu acho que sim.

Quer uma atitude louvável? Recentemente a editora Barba Negra realizou um concurso caça talentos, onde ofereceu um prêmio de 20 mil reais para o melhor projeto de graphic novel original. É dessas atitudes que precisamos.

Enfim, empreendedorismo, de todas as formas, é a solução para os quadrinhos nacionais, aliado a uma produção de qualidade e independência de qualquer forma de amparo estatal.





4 Comentários:

JRP disse...

Apoio veementemente sua colocação.
Usar dinheiro público para publicar gibi é de uma ofensa e mal caratismo a toda prova.
Porque essa grana é retirada do orçamento, quando deveria ir para a Saúde, Educação, Segurança, enfim, deveria ir para áreas que realmente precisam.
E não financiar carreiras de autores que fazem HQs de cangaço que depois tem a tiragem vendida para o governo.
É possível viabilizar projetos comerciais interessantes e atrativos sem precisar mamar na teta do Estado paupérrimo feito o nosso.
Não precisamos de concursos, festas, convenções ou bobagens desse tipo.
Precisamos do fomento de CRIAÇÃO DE PERSONAGENS e a viabilização da mídia HQ como meio de levar diversão para o leitor...
E ganhar um dinheiro com isso.
O resto é perda de tempo que nos rende apenas o domínio dos comics e mangás nas bancas.

Roger Olivieri disse...

Concordo plenamente. Chega de estado babá! O que faz um país grande é o empreendedorismo de seu povo, não o tamanho do estado. Isso vale para qualquer setor seja indústria, arte, tecnologia etc. Mais uma vez, sua colocação é perfeita, bro! Parabéns!

Fernando Fumihiro Aoki disse...

Sem contar que material resultante de "compra" por parte do Estado acaba sendo DESOVADO nas escolas, a título de paradidático, e por ser PORCO, RUIM ou simplesmente FERRAMENTA DE PROPAGANDA IDEOLÓGICA ESTATAL, acaba GERANDO ÓDIO a este tipo de publicação, e AFASTANDO leitores em potencial para obras em quadrinhos em geral, o que leva a MENOS PÚBLICO CONSUMIDOR no futuro...

Será que esses putos não aprenderam NADA com aquela merda da reserva de mercado da informática nos anos 90 ? Somos obrigados a repetir eternamente a história? Que retrocesso!

FERNANDO disse...

É simplemente incrível o quanto todos vocês são ignorantes em relação ao ProaC... O sr. Mauro Tavares que escreveu esse texto não se deu ao trabalho de pesquisar sobre o assunto, e expôs aqui uma série de deduções meramente fruto de uma opinão baseada em conhecimento raso sobre o assunto...

Se há pessoas que procuram o ProaC pra realizar seus projetos. é porque não são tão priveligiados quanto o Mauricio de Sousa, Gêmios, Grampa ou o Beytuth. Pegou pesado com os demais vencedores do Proac mas alivio pro Beytuth... Porquê? Ele é o seu favorito, as possos que vc gosta ou prefere podem e o demais não...
O edital do ProaC é considerado um prêmio oferecido pela Secretaria de Cultura do ESP e são SELECIONADOS 10 contemplados, ou seja NÃO é dinheiro doado para uma classe que simplismente "vai ficar mamando nas tetas do governo", muito trabalho ruim que não merece simplismente não recebe o prêmio, foram 137 projetos inscitos e apenas 10 contemplados... O que são apenas DEZ projetos contemplados...? Em vista dos MILHÕES que nos custam os salários "faraônicos" dos nosso políticos ou a absurda carga tributária que somos obrigado a arcar... Pela lógica de todos VOCÊS (me refiro aos demais que postaram comentário antes de mim também) os únicos que não tem direito ao dinheiro publicos são os quadrinhistas (e artistas e estudantes em geral) Um artista receber R$ 25 mil pra realizar um projeto em 8 meses é errado, mas um deputado receber mais de R$26 mil por mês pra fazer um monte de merda ou simplismente pagar o montante de quase 50% e cima do que consumimos em impostos, pra VOCÊS isso tá certissimo, né...?!

Faça um favor, carissimo sr. Mauro Tavares, pesquise melhor e procure primeiro entender sobre o que vc está falando, pra não criar equivocos infelizes como o desse seu texto...

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