Grant Morrison fala sobre a animação All Star Superman
Mas pode ser que eu não entenda nada do Superman como personagem, é verdade, eu nunca gostei muito dele. O azulão me incomoda por ser um personagem infantil demais e que resolve as coisas com muita facilidade, nunca me pareceu que dava pra fazer boas histórias com o cara. Sem falar que ele pode ser o representante perfeito da imposição dos valores imperialistas americanos ao mundo todo.
Mas deixando a detonação de lado, a série de Grant Morrison é bonita, tem a arte esplendorosa de Frank Quitely e resgata o prazer pré-adolescente de ler um gibi em toda sua suposta inocência. É realmente emocionante ver os quadrinhos tratarem de assuntos como a morte do herói, suas paixões individuais e dramas humanos, sem ser pesado e melancólico como os gibis dos anos 1980, mas com as cores e o clima surreal ingênuo da Era de Prata.
Por ocasião do lançamento da animação baseada na HQ, o escritor Grant Morrison deu uma entrevista ao Comic Book Resources, onde falou sobre o que achou da adaptação e sobre a possibilidade de uma futura sequencia da série.
A animação foi produzida pelo consagrado Bruce Timm e escrita por Dwayne McDuffie, com lançamento em DVD e Blue Ray marcada para hoje, 22 de fevereiro.
Ninguém melhor que o próprio careca escocês para comentar a série, leia a entrevista:
CBR: Quando a Warner Brothers e a DC decidiram adaptar "All Star Superman" para uma animação, eles entraram em contato com você e lhe comunicaram de suas intenções?
Grant Morrison: Oh, sim! Eu soube de tudo desde o início. Na verdade, eles me convidaram para colaborar com o roteiro, mas na época eu não estava disponível, andava muito ocupado com outras coisas, então não foi possível. Mas é claro, eu sabia desde o início de tudo, assim que o filme começou a ser feito.
O que você achava de transformarem sua história em um filme? Algumas pessoas acham que os quadrinhos, especialmente algo como "All Star," simplesmente não podem ser traduzidos na forma de filme.
Eu não sei, eu acho que os quadrinhos são um tipo de filme em um formato diferente. Ambos partilham a mesma ideia de uma boa história. Todo mundo gosta de uma boa história, então eu acho que esta é uma das coisas a ser traduzida de uma mídia para outra. Foi por isso que me interessei em vê-lo. Estava interessado em ver tudo se movendo e a transformação pelo qual passaria. Era uma experiência pra mim ver o que eles poderiam fazer e eu estava muito satisfeito com os resultados.
Quando falam sobre "All Star Superman", as pessoas sempre se referem a série como um Superman da Era de Prata com sensibilidades da Era Moderna. Mas se você olhar o gibi, há várias Eras do Superman presentes nele. Quando você sentou para escrever, o que se passou pela sua cabeça para criar o Superman que nós vemos na revista?
Era pra questionar: "Qual o Superman essencial?" Realmente, há três diferentes Eras, e eu lí todas elas, desde o Superman de 1938, o socialista desconexo que só podia saltar 200 metros, até o Superman dos anos 1950, que está sempre em grandes encrencas, mas seus problemas ainda são problemas humanos, podendo até mesmo ter calvície, engordar e envelhecer, sendo o mais normal de todos eles. E então vem o Superman superhumano dos anos 70, que é apenas um histórico de lutas contra os caras maus e outros super heróis.
Eu tentei refletir sobre o seguinte: "De tudo que há nessas versões, o que permaneceria?" Por que algo sempre permanece. Todo escritor que trabalha com o Superman tem de fazer com que o seu pareça o novo Superman definitivo. Assim, mesmo que já tenha existido uma porção de versões diferentes, pra mim a questão era encontrar o cerne da coisa. Eu encontrei aquilo em quadrinhos dos anos 50 e 60, o que os fazia grandiosos era, como eu disse, que eles tratavam de emoções humanas reais e histórias de pessoas humanas reais, mas que aconteciam em uma escala planetária e com pessoas do futuro, de outros mundos, com monstros e robôs.
Mas na verdade era sobre levar o cachorro pra passear, sair com uma garota e se meter em encrencas. Acho que é por isso talvez que as pessoas pensem em "All Star Superman" como algo mais Era de Prata no sentido de tentar fazer novas e modernas histórias humanas reais, mas na escala gigantesca de Superman. Este é o ponto mais interessante, é o "homem." As melhores histórias são apenas sobre esse cara tentanto dar um sentido pras coisas, e a garota não gosta dele tanto quanto ele queria que ela gostasse. O cara mau o odeia mas ele gosta do cara mau. Isto é real, pequenas coisinhas emocionais humanas funcionam muito bem quando você as expande em uma proporção cósmica.
Uma porção de gente que não é fã do Superman sempre reclama que ele não é interessante por que ele é muito poderoso. "Como pode haver drama quando ele pode partir um planeta em dois?" Mas como você disse, os eventos são em escala cósmica, mas a história é sobre o homem.
As melhores histórias do Superman, principalmente naquela Era ao qual me referi, são coisa do tipo "A morte do Superman" e "Superman retorna a Krypton." Realmente havia histórias de amor e histórias de dor, mas como eu disse, você as põe em uma escala bíblica, com armamento cósmico e naves espaciais e parece ótimo. Eu acho que as Histórias em Quadrinhos devem ser sobre essa coisa toda. Eu adoro os quadrinhos que tem uma grande energia e super heróis em grandes conflitos. Como você disse, o Superman pode ser tão poderoso quanto quiser, mas seu coração pode ser partido e é por isso que não importa se ele pode arremessar planetas. Se você parte o coração dele, ele é inútil. As histórias emocionais são sempre o grande barato do Superman.
Com relação ao filme, eles obiviamente tiveram de cortar cenas, não poderiam incluir tudo que há no gibi. Há algo que que você gostaria que eles tivessem incluído que eles não colocaram lá?
Sempre há coisas que você pensa "Ah, seria legal se tivesse isso" mas eu estava mais impressionado com o fato de eles terem conseguido incluir tanto. Eu fiquei realmente surpreso por Atlas e Sansão estarem lá. Eu pensei: "Não tem jeito de eles botarem esses caras lá". Mas eles ganharam vida. Digo o mesmo sobre a história dos Kryptonianos. Eu gosto muito da natureza quase épica disso, de mostrar esses dias inusitados em que estamos em contagem regressiva para a morte do Superman. Então, sinceramente, eu estava mais impressionado com o fato de eles terem colocado tanta coisa. Quando eu reli o gibi, pensei: "Ah, teria sido legal se pussedemos ter visto os Bizarros, seria ótimo se tivessemos a garota gótica sozinha no topo do arranha-céu," mas já há tanto ali que é quase um milagre. É um gibi grande, com 250 páginas, e eles adaptaram para um longa-metragem.
Tem alguma cena em que você estivesse particularmente interessado em como ela seria adaptada na passagem do gibi para o filme?
Meu Deus, tem um monte delas. Particularmente, o momento em que Solaris chega e salta para essa coisa cósmica. Eu acho que não vemos nada assim em Superman há um bom tempo, não nas telas. Isso é completamente sci-fi, fantasia, sabe, "Enfrente o flagelo dos mundos". Esse tipo de diálogo grandioso que eu acho que funciona mesmo pro Superman. Quando ele aparece na tela e começa a falar desse jeito, eleva tudo a um nível muito épico. Eu gosto mesmo disso. Tanto quando do jeito que eles capturaram os enquadramentos e composições de Frank Quitely e o novo visual em que eles apresentaram tudo isso no formato alongado da tela de TV, ficou muito legal, eu adorei disso.
Com relação ao que você disse antes, sobre Superman nunca ficar com a garota e sobre como ele vê Lex. Isto resume sua visão definitiva do personagem? Esta é a sua versão de como as histórias do Superman deveriam ser hoje?
Sim, é assim, "Se eu fosse escrever isso todos os meses, seria assim." Não afirmando que é a única maneira de fazer. Eu ficaria triste se o Superman não tivesse mudado, e ele muda em cada geração, as vezes até mas rápido que isso. Mas eu adoro todas as diferentes versões, até mesmo aquelas que são bem diferentes do "All Star Superman." Eu acho que se eu tivesse de fazer denovo, por exemplo, eu gostaria de fazer o primeiro Superman, que só levantava caminhões e que podia ser ferido pela explosão de uma granada. Gostaria de fazer algo realmente interessante com aquele cara. O jovem e furioso Superman. As diferentes versões sempre me fascinaram por que todas elas se somam a essa enorme, gigantesca, história multi-generacional. Isso é algo completamente único.
Quando se trata da ideia da evolução do Superman por gerações, na conclusão de "All Star", Superman está se convertendo em pura energia. Olhando para como as pessoas tem evoluído, especialmente com a tecnologia, estamos nos aproximando de um ideal do Superman. Você acha que o Superman tem de continuar evoluindo por que ele precisa ser sempre mais do que nós podemos ser enquanto seres humanos?
Absolutamente. Superman sempre esteve um pouco á nossa frente. Voltando as primeiras histórias, ele é um cara musculoso, é um cara forte. Eu amo essa parte dele, a parte durona do Superman. Ele jamais poderia chorar ou algo assim. Ele devia ser sempre um cara durão, por que ele foi criado em um rancho, lançando feno. Ele é um menino machão. Mas, é sim, acho que ele esta sempre á nossa frente. Nos anos 50 fizeram histórias diferentes por que eles não estavam tentando ser realistas naquela época. O Superman original de Joe Shuster e Jerry Siegel é uma espécie de "Os Supremos" ou tipo "Watchmen". Tenta mesmo se localizar no mundo real com esse cara super forte que pode sair saltando por ai. Quando chegamos aos anos 50, as emoções eram reais, mas a energia que temos é mais do imaginário daquela década. Então, acho que o Superman sempre está a frente da ideia que nós fazemos de um super homem.
Agora mesmo, hoje, nós somos como um povo cyborgue. Todo mundo tem um telefone que o conecta a um cérebro global, assim eles não tem que lembrar de qualquer informação ou nomes e numeros de telefone. Temos máquinas que permitem a você se comunicar com o mundo inteiro. Hoje nós nos tornamos um tipo de superhumano, e pra mim a ideia era de que o próximo passo seria um Superman transcendente, e é o que temos lá no final. Há uma imagem mítica dele, de um cara no coração do sol continuamente trabalhando para salvar a humanidade no nível mais elevado. E ao mesmo tempo ele meio que transmitiu o seu DNA, ai você sabe que vai existir um Filho do Superman, ou quase. Eu quis mostrar que existe esta versão mais elevada e transcedente do Superman no final, mas também é um homem que esta deixando o seu DNA, legando tudo que ele é na forma de um filho ou uma filha.
Gostaria de uma definição sobre esse detalhe. Quando a série terminou, você mencionou que teria ideias para pelo menos mais duas histórias que gostaria de contar. Ainda gostaria de explorar essas ideias um dia?
Superman é um ótimo personagem, o Superman, sinceramente, eu poderia escrever pra esse personagem eternamente. Sim, se tiver a oportunidade, eu adoraria fazer essas duas histórias algum dia. Tem um monte delas, eu vou criando novas o tempo todo, esse é o problema, uma nova história do Superman simplesmente vai surgindo. Uma das coisas que eu gostaria de fazer com essa ideia do Filho do Superman era pegar aquela coisa antiga das histórias dos Super Filhos e atualizar, modernizar e juntar o Filho do Superman com o Filho do Batman. A primeira página teria Superman e Batman apertando as mãos e dizendo: "Parabéns velho amigo. Acabamos com todo o crime". Um dia poderia fazer isso com eles ou com alguma versão deles. Tem um pouco disso na série do "Multiverso" que eu estou trabalhando, algumas dessas histórias sempre voltam de alguma forma. E eu tô chegando perto, dentro de alguns anos, de envolver o Batman. A ideia de fazer mais algumas coisas com o Superman tá ficando denovo cada vez mais interessante.
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1 Comentário:
Superman deu origem a toda uma nova mitologia, os super-heróis, por isso que precisa sempre ser o maior e mais poderoso de todos.
All-Star Superman é uma visão interessante do herói, não é minha preferida, mas tem ótimos momentos.
E, no final, das contas, Mitologia é justamente isso, oferecer o vislumbre da vida eterna, ou a "transcendência" citada por Morrison.
Outra série que trata bem desse conceito é o "Gerações" de John Byrne.
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